quarta-feira, outubro 15, 2014

A L. e os paradoxos da vida (ou da História)

A L. é ucraniana. Veio para Portugal, com o marido, há um bom par de anos. Deixaram ficar lá longe uma filha adolescente, e trouxeram muitos sonhos e esperanças. Por cá fazem a (sua) vida. Com as saudades que os canais de televisão e os "skypes" anexos atenuam e acirram.
A L. tem uma formação para-médica, especializada em gerontologia (o que por vezes dá jeito...), e ajuda-nos três manhãs por semana na lida da casa e do quintal... e do gato Mounti com que tem uma relação especial. 
Ao princípio, conversávamos muito e informávamo-nos mutuamente. Da política e das políticas. E entendiamo-nos, à nossa escala. 
Até que começou a "questão ucraniana". Foi logo evidente a sua ilusão "europeística", o crédito das informações que lhe vinham da filha, toda empolgada com a "demo cratização", as críticas ao que estava mal aproveitadas pelas forças que queriam ainda fazer pior..., a visceral "alergia ao russo" (que não ao comunismo).

Acabaram as conversas. Por tácito (des)acordo. Com base em informações diferentes e opostas. Sem rupturas nem animosidades. Talvez à espera de melhores dias. Ou de outros dias.

O marido da L. está desempregado. Mexe-se bem no aproveitamento dos subsídios e cursos de formação. Beneficia do que o povo português conquistou com a ajuda de outros povos e exemplos, como o seu quando na via do socialismo. É grande, como a L., maciço, aparentemente um enorme bebé mas sabe mexer-se e beneficiar do que, aqui, foi conquistado numa correlação de forças de então e que, no decurso (lento e com saltos) do tempo, se tem alterado e possibilitado o ataque brutal a essas conquistas.

Há muito de paradoxo (ou de contra dições) nesta situação.
Às vezes paro a pensar na vivência da História através das pequenas estórias de cada um de nós.

2 comentários:

Justine disse...

muito bem contada, a estória da "nossa" L.
E boa base de partida para reflexões sobre informação, desinformação, convicções e enganos...

Olinda disse...

Uma estôria que se poderia chamar:"L e o embuste do modelo europeista".

Bjo