sexta-feira, abril 25, 2008

Intervenção na Assembleia Municipal

Ontem, houve sessão da Assembleia Municipal de Ourém.
Li esta intervenção:
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Hoje é o dia 24 de Abril. De 2008.
Espero e gostaria que todos compreendessem que, neste dia, eu fale do dia 24 de de Abril de 1974. Mas também acrescento que se alguns não compreenderem de pouco me importa...
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Há 34 anos, neste dia, esperava, numa cela em Caxias, que me viessem buscar para o interrogatório e a tortura. Que já conhecia de outras vezes que por ali passra. Numa delas com permanência de longos meses.
Não foi o que aconteceu. Porque, no dia seguinte, do dia da manhã, militares e familiares e amigos, e camaradas, e mais uns bastantes, vieram abrir as portas da cadeia. Pelo lado de fora.
Estava preso, eu e muitos, por lutarmos pelas nossas ideias e ideais, por querermos para Portugal e os portugueses democracia e liberdade.
Libertamos temos, democracia temos. Naquela vivemos, esta parece-me bem escassa, bem pobre, a necessitar urgentemente de ser melhorada, que se trave a rampa perigosa em que a colocaram.
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Ainda ontem, na Assembleia da República, foi ratificado um tratado a que deram o nome de Lisboa, em que, ao definir os seus princípios democráticos, afirma no art. 10º que a democracia representativa é o seu elemento essencial, para logo no art. 11º dizer que as instituições, or orgãos compostos pelos eleitos, pelos representantes, podem dar, repito, dar (!) a possibilidade aos cidadãos de participarem nas decisões que a eles dizem respeito.
Assusta.me esta formulação. A democracia representativa é muito mas nada é se os representantes, nos seus mandatos, deixarem de fortalecer ou de manter a democracia participativa.
Na exemplificação deste risco, do risco da fragilização da democracia até pôr em causa a liberdade, os governos, e quem, neles manda, os partidos daquela maioria, e quem neles manda, fugiram ao debate sobre o dito Tratado de Lisboa, e impediram que o povo participasse, pronunciando-se sobre a sua ratificação. Porque a sua matriz a dita (e mal) Constituição Europeia foi rejeitada pelos holandeses e pelos franceses, e não se quer que, de novo, isso possa acontecer.
Ao contrário do que ouvi, não haveria pior maneira de celebrar o 25 de Abril, celebrando-se o 23 e o 24 de Abril.
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Lamento-o hoje, aqui neste orgão democrático, que deveria ser a "ponte" para os cidadãos poderem participar, até porque todas as sessões aõa públicas e um ponto da ordem de trabalhos lhe é dedidao, à sua participação e intervenção. Aqui quero fazê-lo.
E mostrar como nos pequenos pormenores estamos a deixar fugir a oportunidade temporal de trazermos os nossos concidadãos ao exercício dos seus deveres e direitos.
Já aqui chamei a atenção para estapequan-grande falha. Mas eu insisto porque teimoso sou.
O edital que convoca esta sessão da Assembleia Municipal termina assim "para constar e devidos efeitos, será este edital afixado nos Paços do Concelho, Juntas de Freguesia e lugares de estilo". Pois o lugar mais "de estilo", por ser o da "informação municipal" à frente dos Paços do Concelho continua vazio destes editais.
Pormenor sem importância, dirão. Sinal dos tempos, direi eu, em que nada se faz para valorizar a democracia participativa, em que tudo se faz para a subalternizar até ao apagamento face à democracia representativa.
E termino gritanto, em voz baixa mas vinda bem cá de dentro e cá para dentro de mim:
viva o 25 de Abril!

8 comentários:

bettips disse...

Um abraço ENORME.
Obrigada. Por existires e por me permitires conhecer-te!

Anónimo disse...

É preciso melhorar a semente do 25 de Abril, esta degenerou e ficou vulnerável, não queremos um Abril transgénico, queremos a semente original!
Abraço
Manangão

Maria disse...

Porque será que me comovo com o que escreves?
Um abraço, e um cravo

Justine disse...

Garanto-te que eles não perceberam nada. É como deitar pérolas a porcos!!

GR disse...

Nós percebemos!
Comovida, com o mais profundo respeito e muito orgulho em ti, camarada Resistente digo,
OBRIGADA!

Viva o 25 de Abril!

GR

Anónimo disse...

Uma excelente intervenção apesar de singela. Se a vara não percebeu os cidadãos comprenderm-na bem.

Anónimo disse...

Mais um " 25 de Abril" como é bon ler mais uma vez un pedaço da Vossa (nossa história) . Não devemos deixar de caír no esquecimento o que tantos homens e mulheres sofreram para que hoje vivamos em liberdade .... Viva quem por ela tanto lutou.
Origada para todos.
Um grande abraço .
Amélia

Sérgio Ribeiro disse...

Obrigado a todas e todos pela receptividade a este extravasar de umas palavras que quis oportunas e mais o foram dadas circunstâncias a que vos poupo mas que foram muito significativas.
Vale a pena ser uma voz no meio de 39 e mais uns, que falam alto e quase todos surdos...
A luta continua. Contínua.